sexta-feira, 17 de abril de 2015

Um holandês gameleiro

Símbolo da solidariedade, Padre Henrique Helsllot
 revolucionou o cuidado com as crianças em Capão Bonito





Padre Henrique é filho de holandeses. Descobriu sua vocação sacerdotal e social ainda na adolescência. Nessa época, ia à missa aos domingos, rezava antes de dormir e acreditava que a Igreja só existia para castigar os que errassem. Decidiu-se libertar-se e foi conhecer a Igreja a fundo.

Tinha grande desejo de saber de tudo: sobre as pessoas e a vida, e encontrou o que lhe pareceu fundamental: Deus. Em longas noites de meditação, se perguntava se não era mais importante deixar o que vinha fazendo para seguir o exemplo de alguns raros homens e cuja missão era: ser religioso e ajudar as pessoas.

Cursou o seminário que o transformou em padre no próprio país onde nasceu: Holanda. Enquanto aprendia Filosofia e Teologia, os canhões da Segunda Guerra Mundial derramavam sangue por toda Europa. Por lá, foram 13 anos de sacerdócio comandando três paróquias, mas sentiu que não estava feliz. Falta-lhe algo mais profundo, mas humano, mais solidário. Henrique Helsllot era fascinado pelos projetos sociais, e queria tocar um com seu DNA.

Por diversas vezes tentou sua transferência da Holanda para outro país, até que um dia, um de seus tutores no seminário virou Bispo e abonou sua reivindicação.  Padre Henrique desembarcou no Brasil em 1968, em plena ditadura militar, e foi recebido pelo então arcebispo de São Paulo Dom Paulo Evaristo Arns. Sua missão religiosa na capital paulista durou cinco anos, e após o desmembramento das paróquias da região de Itapeva da Diocese de Sorocaba, Padre Henrique foi convidado para comandar diversas comunidades católicas no município de Capão Bonito.

Chegou à cidade em 1973 com objetivo de melhorar e reorganizar as atividades católicas, que foram meio deixadas de lado pelo padre da época, que se aventurou na política e acumulou também o cargo de prefeito, o prefeito de batina. Botou os pés aqui e foi logo discutindo e participando dos problemas da comunidade com a mesma veemência dos veteranos da aldeia.

Quis ir além da sacristia, e adquiriu uma área de 3,5 alqueires, equivalente a 77 mil metros quadrados, para iniciar os primeiros passos de um projeto que transformaria o conceito de assistência social no município. Numa de suas visitas às comunidades mais carentes, ficou inconformado com as condições alimentares e de saúde de muitas crianças. A imagem daqueles pequenos meninos e meninas desnutridos lhe chamou a atenção e atingiu sua sensibilidade em cheio. Nasci desse descaso infantil a ideia de construir o Centro de Assistência Social.

O começo, como tudo na vida, foi difícil. A falta de estrutura e a escassez de profissionais na área, foram às primeiras dificuldades encontradas. Mas a vontade de transformar a vida daquelas crianças foi superior, e o padre, que trocou seu país de origem por uma pequena cidade do interior paulista, venceu todos os obstáculos e barreiras que encontrou pela frente, e hoje, graças a seu empenho, à sua liderança e ao apoio de milhares de capão-bonitenses, o sonho está vivo e é real.

Os homens comuns não entendem esse estilo de vida. Abandonar o conforto de um país desenvolvido para, muitas vezes, sofrer humilhações pelo simples objetivo de ajudar uma criança, é uma opção que só vemos nos homens diferentes, nos líderes, que com uma breve frase, arrastam multidões para o mesmo propósito.
Capão Bonito comemora na próxima quarta-feira, dia 02 de abril 156 anos, e muito de seus avanços e conquistas deve-se a este holandês gameleiro, que escolheu um estado de vida aqui que só pode ser entendido em função da fé e da solidariedade. Renunciou ao mundo da vaidade e da individualidade para se dedicar aos pobres, aos humildes, ao seu rebanho.

Ele lutou para que a Igreja e a sociedade não ficassem ao lado das estruturas que oprimem os mais necessitados. Padre Henrique lutou por uma mudança, que permitiu uma justa distribuição dos serviços sociais. 

Aos 83 anos, esse homem que mudou o conceito de assistência social em Capão Bonito continua com a mesma sobriedade de quando pisou neste chão no início da década de 70. Lembra-se de todos os detalhes do início de sua jornada religiosa e social e orgulha-se em dizer: “Aqui construiu minha vida, realizei meu sonho e de muitas crianças. Aqui está a obra, o Centro de Assistência Social. Seja bem-vindo!”.


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